27/06/2011 - 17h18
Suplente de Marisa tem dívida milionária
Antonio Russo Netto, que assumirá o Senado nesta semana, é acusado de ter causado R$ 3,5 bilhões de prejuízos a pecuaristas
Marisa Serrano deixa o Senado esta semana, e seu suplente já assume com problemas na Justiça |
Fábio Góis
O substituto da senadora Marisa Serrano (PSDB-MS), eleita conselheira do Tribunal de Contas do Mato Grosso do Sul na última semana, chegará ao Senado com uma incômoda e milionária pendência de seus tempos de empresário. Primeiro-suplente da tucana – que se desfiliará da legenda para assumir o posto, por imposições constitucionais –, Antonio Russo Netto sofre ação na Justiça sul-matogrossense, acusado de ter causado prejuízos da ordem de R$ 3,5 bilhões a pecuaristas de todo o Brasil, no processo de recuperação judicial de rede de frigoríficos que eram de sua propriedade.
O substituto da senadora Marisa Serrano (PSDB-MS), eleita conselheira do Tribunal de Contas do Mato Grosso do Sul na última semana, chegará ao Senado com uma incômoda e milionária pendência de seus tempos de empresário. Primeiro-suplente da tucana – que se desfiliará da legenda para assumir o posto, por imposições constitucionais –, Antonio Russo Netto sofre ação na Justiça sul-matogrossense, acusado de ter causado prejuízos da ordem de R$ 3,5 bilhões a pecuaristas de todo o Brasil, no processo de recuperação judicial de rede de frigoríficos que eram de sua propriedade.
Ex-proprietário dos Frigoríficos Independência, que chegou a ser o segundo maior frigorífico exportador do país, Russo é alvo de ação popular na Justiça Federal na capital sul-matogrossense Campo Grande movida pelo empresário Florivaldo Alteiro Leal. Ele quer a suspensão da diplomação de Russo no Senado, alegando que as movimentações e o histórico financeiro do primeiro-suplente não o tornam apto para a função de senador. Em hipótese de êxito de Florivaldo, assumiria Ruben Figueiró de Oliveira, segundo-suplente da tucana.
O autor da ação popular alega que as ações empresariais de Russo foram “financeiramente imorais”, lesando patrimônios municipal, estadual e federal graças ao suposto calote. “Ele busca se proteger das sanções e de sua dívida por meio do foro privilegiado”, registra Florivaldo na peça acusatória. Ele acrescenta que Russo permanece à frente do Grupo Independência mesmo depois de ter repassado o comando dos negócios aos filhos, o que diz ter feito há cerca de cinco anos, antes da falência do empreendimento – um dos maiores pagadores de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do estado.
Segundo o acusador, a contestação está na declaração de bens à Justiça, no pleito que assegurou a vaga de Marisa no Senado. “Na relação dos bens do suplente, registrada no Tribunal Regional Eleitoral, em 2006, ele aparece como um dos principais sócios do empreendimento frigorífico”, aponta Florivaldo.
Conselho de Notáveis
No contexto das denúncias contra Florisvaldo, um ingrediente extra também pode significar posteriores questionamentos na ação judicial na iminência da posse no Senado, ainda sem data para ser efetuada – Marisa formalizará a renúncia do mandato nesta semana, de acordo com sua assessoria de imprensa. Tratam-se das relações políticas operadas pelo suplente em nível regional – o que, na opinião de políticos sul-matogrossenses, representariam mais um elemento para a ação judicial.
Russo era o principal articulador do chamado Conselho de Notáveis do Mato Grosso do Sul, que norteou a atuação política do primeiro mandato de Zeca do PT, governador do estado por dois mandatos consecutivos, entre 1999 e 2006. O colegiado era integrado por apadrinhados do poder político local supostamente contemplados pelo regime especial referente ao pagamento de ICMS.
Entre eles estariam, além do próprio Russo, o empresário Jaime Valler; o financiador de campanhas eleitorais José Carlos Bunlai, atualmente empresário do setor sucroalcooleiro; e o usineiro José Pessoa. Compunham ainda o grupo, entre outros, Lélio Ravagnani Filho, Luis Fernando Buainain, Luiz Humberto Pereira, Pedro Chaves, Sérgio Dias Campos e Valdir Zorzo.
Interlocutores da cena política regional acreditam que Russo, uma vez no Senado, poderá atuar de maneira a promover, por exemplo, a recuperação judicial do grupo Independência. Seria uma espécie de atividade, avaliam políticos sul-matogrossenses, análoga à que Russo exercia no Conselho de Notáveis. De acordo com a imprensa local, a influência do suplente de Marisa pode ser medida pelo fato de ele ter realizado uma das reuniões do colegiado, com a presença do governador Zeca do PT, nas dependências do Frigorífico Independência, em Nova Andradina, em 31 de julho de 2003. Era uma quinta-feira, e o convescote serviria para decidir quais seriam os contemplados pelos incentivos fiscais especiais via Conselho de Desenvolvimento Econômico do Estado.
“Barão da carne”
O Frigorífico Independência deve voltar às atividades já no segundo semestre de 2011, quando Russo já deve estar envolvido com as funções legislativas no Senado. A opinião é de consultores e empresários do setor que participaram da Assembleia Geral de Credores do Independência, realizada em 3 de março em Campo Grande. Na ocasião, um novo plano de recuperação judicial da empresa foi aprovado, diante da garantia de alienação das unidades de produção do grupo por meio de procedimento competitivo.
Na linguagem do mercado, isso equivale à fase conclusiva de recuperação do empreendimento depois de sua derrocada, a partir de 2008, em meio à crise econômica internacional. Também foi publicada naquela Assembleia a homologação do acordo firmado em 19 de abril pelos credores com o grupo. O ato foi formalizado pelo juizado da 1ª Vara de Cajamar (SP) – município que, localizado a cerca de 40 quilômetros de São Paulo, sedia o centro administrativo da empresa. As partes consideram que os termos do acordo garantem as condições legais para que o grupo passe a receber propostas de aquisição e incorporação.
Prestígio – inclusive internacional – é o que não falta para que o Grupo Independência volte ao mercado da carne, em movimento devidamente acompanhado por Russo. Em 2003, o jornal norte-americano The Wall Street Journal publicou reportagem sobre o empreendimento de Russo chamando-o de “barão da carne”. O texto narra a visita que o empresário fez a Tel Aviv (Israel), em 2001, em pleno surto de violência entre israelenses e palestinos. A intenção, diz o jornal, era fechar um contrato com um grande distribuidor de carne de Israel. O arrojo de Russo ao negociar em um ambiente de animosidade deflagrada, em plena guerra civil, chamou a atenção no cenário agropecuário brasileiro.
“Mau caráter”
Russo nega o favorecimento. Em entrevista concedida ao Congresso em Foco no Plenário do Senado, na última terça-feira (21), ele resumiu da seguinte maneira o caráter de seu acusador: “É uma pessoa de mau caráter, que está se aproveitando de uma situação jurídica para me atacar na física [sic]. Mas, pelo que eu estou sabendo, ele só está fazendo isso para me achacar”, disse Russo, para quem o acusador quer aparecer na mídia.
Para o suplente, a história da dívida de R$ 3,5 bilhões está mal contada, e hoje não passaria de R$ 700 mil. “É um processo que está correndo no âmbito jurídico, e não de outra ordem. Quanto ao débito de 3 bilhões e meio, isso não existe. É apenas uma recuperação judicial dos frigoríficos que eu doei aos meus filhos há quatro, cinco anos. Infelizmente, eles cresceram demais e, quando quebrou a Sadia, a Bertin e todas as outras empresas, eles quebraram também”, disse, referindo-se às empresas do setor acometidas pela crise econômica mundial de 2008.
“A Bertin foi para o grupo JBR, a Sadia foi para a Perdigão e eles [os filhos] achavam que dava para sair [da ameaça de concordata], mas não deu”, acrescentou Russo.
Ainda de acordo com Russo, as pendências referentes ao frigorífico devem ser fácil e rapidamente “sanadas” ainda neste ano. Agora, diz, apenas impasses bancários ainda carecem de solução, mas sem a capacidade de causar mais prejuízos financeiros a produtores rurais. “Hoje, 76% dos pecuaristas já foram pagos, e 98% dos insumos diretos também. Acredito que até o final do ano nós vamos ter uma solução final sobre tudo isso”, considerou.
Infidelidade
Antes de ser indicado à primeira-suplência na coligação de Marisa, Russo era filiado ao PR. Depois da convivência com a senadora, resolver pedir filiação ao PSDB. Mas, com a reviravolta da vida pública da tucana, resolveu retornar ao PR, para evitar eventuais processos por infidelidade partidária – entendimento da Justiça Eleitoral considera que o mandato pertence ao partido, não ao titular. Agora, Russo terá de seguir a orientação governista da legenda no Congresso.
Para o suplente, as pendências empresariais de sua família não o preocupam na nova empreitada no Senado. “De forma nenhuma. O frigorífico não tem nenhum processo de ordem de falta de recolhimento de impostos. Todos os impostos já foram devidamente pagos religiosamente, não existem débitos fiscais”, destacou, acrescentando que as obrigações formais estão todas cumpridas junto à Receita Federal.
Para o suplente, as pendências empresariais de sua família não o preocupam na nova empreitada no Senado. “De forma nenhuma. O frigorífico não tem nenhum processo de ordem de falta de recolhimento de impostos. Todos os impostos já foram devidamente pagos religiosamente, não existem débitos fiscais”, destacou, acrescentando que as obrigações formais estão todas cumpridas junto à Receita Federal.
Para Russo, o impasse empresarial é menor do que a nova responsabilidade. “Eu acho que isso [substituir Marisa] é o mais difícil”, risos. “Lidar com os achacadores é mais fácil. A senadora Marisa é um ícone da política nacional. Dentro do estado, ela é muito querida”, concluiu Russo, acrescentando que, ao retornar ao PR, vai seguir a orientação partidária de alinhamento ao governo.
Decisão pessoal
Já a senadora Marisa Serrano diz confiar na competência e na lisura do seu primeiro-suplente. “Ele foi colocado na coligação [de 2006], indicado pelo PR nessa composição. Ele sempre foi tido como um grande empresário do estado, um dos maiores pagadores de ICMS”, destacou a senadora, para quem o PSDB não ficará enfraquecido com sua saída – o equilíbrio estaria, como lembrou Marisa, na substituição do governista João Ribeiro (PR-TO), licenciado por motivos de saúde, pelo tucano Ataídes de Oliveira (TO), seu primeiro-suplente, no posto desde 3 de maio deste ano.
Marisa evitou comentar ao Congresso em Foco as complicações empresariais de Russo no Mato Grosso do Sul. “Não vou falar por ele. A única coisa que ele passou foi que está pagando todos os credores e, em junho, vai terminar de pagá-los. Ninguém pode chamá-lo de caloteiro, porque ele está pagando”, acrescentou Marisa, negando que sua ida para o tribunal de contas tenha relação com o arranjo que estaria em curso, segundo a imprensa local, que consistiria na concessão do posto de vice-governador ao PSDB, nas eleições do próximo ano.
“Isso não procede. É uma decisão pessoal minha. Discutiram comigo essa vaga. Achei que poderia ser o momento, voltar ao estado. Agora, se o governador vai usar isso [a indicação dela como moeda de troca eleitoral], aí eu não posso dizer mais”, garantiu a tucana, lembrando que o PSDB vai definir candidatura própria para a Prefeitura de Campo Grande.
Segundo o acerto, o atual governador André Puccinelli (PMDB) avalizaria a indicação de Marisa para o tribunal em troca da vaga de vice na coligação com o PMDB. Além disso, a desfiliação partidária da senadora a impedirá de disputar as eleições para a prefeitura de Campo Grande, em 2012, facilitando as pretensões do PMDB também para esse posto.
Primeira mulher eleita para representar o Mato Grosso do Sul no Senado, Marisa Serrano completou 65 anos na última terça-feira (21) e se aposentará compulsoriamente em cinco anos, quando atingirá a idade-limite no órgão de fiscalização.
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