Grampos revelam fraude em licitação de hospital; cai coordenador de Saúde
21 de junho de 2011 | 0h 00
Fausto Macedo, Felipe Frazão, Fernanda Bassette e José Maria Tomazela - O Estado de S.Paulo
Após revelar um suposto esquema de desvio de recursos para pagamento de plantões médicos não realizados, grampos telefônicos indicam a existência de esquema de fraude em licitações para a compra de equipamentos e materiais cirúrgicos no Conjunto Hospitalar de Sorocaba. Ontem, o coordenador de Serviços da Saúde de São Paulo, Ricardo Tardelli, pediu demissão.
Força-tarefa da Polícia Civil e do Ministério Público sustenta que Tardelli sabia do golpe e não tomou nenhuma providência. O coordenador de Saúde é a segunda baixa no governo do Estado desde o início da Operação Hipócrates, na quinta-feira, quando a Justiça mandou prender 13 suspeitos de envolvimento nas fraudes de plantões médicos.
No dia anterior, havia deixado o cargo o secretário de Esporte, Lazer e Juventude, o neurocirurgião Jorge Pagura, citado no inquérito - ele não era investigado, mas caiu indiretamente em interceptação telefônica.
A prisão de Tardelli foi requerida pela polícia, "por extrema e comprovada necessidade, imprescindível para a continuidade das investigações", mas a Justiça não a decretou. O rombo dos plantões fantasmas, com foco no Conjunto Hospitalar de Sorocaba, teria causado prejuízo de R$ 1,8 milhão em um ano.
O grupo especial da polícia e da promotoria agora deve direcionar a devassa para contratos de obras e aquisição de equipamentos e material cirúrgico. Tardelli é apontado como um dos principais envolvidos. Escutas telefônicas revelam que obras e serviços a serem executados eram acertados com empresários antes da publicação do edital. Um diálogo mostra o ex-diretor do CHS Heitor Consani tratando com um empresário sobre a participação em uma licitação do serviço de portaria.
Relatório entregue à Justiça mostra Tardelli tramando a compra de próteses de aço inox, ao preço de peças de titânio, de custo muito mais elevado. "Até agora ninguém reclamou", comenta Consani em diálogo com Tardelli. "A quadrilha também frauda licitações", assinala a polícia.
O relatório destaca a influência do grupo. "Verificou-se um domínio territorial, pois suas ações se estendem a várias localidades, valendo-se os integrantes desses contatos dentro da própria Secretaria da Saúde."
Morosidade. O governador Geraldo Alckmin (PSDB) reconheceu a gravidade das acusações. Ele reclamou da morosidade na apuração de denúncias contra servidores e prometeu criar uma Controladoria-Geral do Estado, de função preventiva, além de auditar os hospitais estaduais.
"Tem de haver controle permanente, auditagem e punição quando se tem fatos comprovados", disse. "Queremos a corregedoria rápida. A denúncia ocorreu em 2009 e ainda não terminou. Isso tem de terminar em 90, 120 dias. Não só vamos fazer a correção do que está errado, mas prevenir problemas."
Alckmin salientou a necessidade de se aguardar a apuração do caso envolvendo Pagura. "Deixe que se apure. Mas, enquanto apura, não fica na secretaria. Na dúvida, já afasta." O governador disse que o neurocirurgião nunca recebeu nada do Estado. "Ele alega que não teve participação em nenhuma licitação ou plantão. E disse que trabalhava no Hospital de Sorocaba, onde cuidava de projetos científicos, e no Hospital Mário Covas, em Santo André, e não ganhava nada."
TRECHOS
Do relatório da Polícia Civil/Ministério Público sobre as fraudes no sistema de saúde paulista:
Impunidade e poder "(Os acusados) auferem ganhos indevidos porque conseguem mesclar (...) os recursos de origem lícita e (...) dificultar (...) a seleção de ganhos, numa clara demonstração de impunidade e poder."
Coerção"O poder coercitivo foi acentuado (...), isso porque há clara interferência na ação daqueles que, por direito e obrigação, deveriam fiscalizar os servidores e, quando relutam em ceder, são alvo de represálias e até mesmo ameaças, mesmo que veladas."
Território dominado"Verificou-se também um domínio territorial, pois suas ações se estendem a várias localidades, valendo-se os integrantes desses contatos dentro da própria Secretaria da Saúde, envolvendo-se ali também políticos e principalmente os empresários que do sistema se favorecem, trazendo desconforto e temeridade para aqueles que do mesmo expediente não se valem."
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