sexta-feira, 1 de julho de 2011

PÃO DE AÇÚCAR

Uma proposta escandalosa

Confesso que estou escandalizado com o esforço do Pão de Açucar para fundir-se com o Carrefour. A possibilidade dessa operação receber ajuda do BNDES me parece ainda mais absurda.
Não estou preocupado com a guerra de acionistas brasileiros e franceses. Minha impressão é que esse negócio é uma ameaça à concorrencia e ao consumidor. Se os cofres públicos precisam ser utilizados nesse terreno, seria mais conveniente que se empregasse recursos no subsídio à alimentação das famílias pobres e não no patrocinio de grupos economicos já muito ricos.
Sou um antigo cliente do Pão de Açucar e considero-me uma vítima de sua política de crescimento e domínio do mercado.
Por exemplo: uma década e meia atrás, quando mudei para a região da Praça Pan Americana, em São Paulo, eu podia escolher. Havia um Pão de Açucar num dos lados da praça. No outro, funcionava um supermercado da rede Sé.
Hoje, os dois supermercados de um dos espaços mais prósperos da cidade pertencem ao grupo Pão de Açucar. Um deles pretende mais ser mais popular. O outro,mais elitista. Na prática, a diferença entre ambos tende a ser cada vez menor, inclusive no preço.
Em sua política de expansão, o Pão de Açucar avança por vários pontos da cidade, pelo interior e pelo litoral do Estado. Também tem estabelecimentos pelo país inteiro.
É claro que não sou o único consumidor brasileiro a testemunhar uma cena como esta.
Estamos falando de um processo que os economistas chamam de assimetria da economia de mercado, que é criada pela distorção nas regras elementares da oferta e da procura. Foi o estudo destes desvios que deu o Premio Nobel de Economia ao professor Joseph Stiglitz. Você pode achar que essa história de concorrencia é bobagem e que o capitalismo tem uma vocação histórica para o monopolio. Concordo.
Mas acho que é possivel criar regras e padrões capazes de torná-lo menos selvagem.  Nos centros comerciais americanos, você só consegue abrir um supermercado se, a poucos metros de distancia, estiver instalado um concorrente. Deu para entender a mensagem.
Eu ficaria muito feliz se o crescimento do Pão de Açucar fosse baseado na concorrencia, no preço baixo, no esforço para cativar os clientes com a oferta de produtos de qualidade a um preço razoável.
Admiro a saga da família Diniz e acho bonita aquela história do imigrante português que tinha uma pequena padaria e fez uma das maiores fortunas do mundo. Essas historias são reconfortantes, vamos combinar.
O problema é que a verdade não tem só este lado. O Pão de Açucar compra lojas — como pretende fazer agora com o Carrefour — para eliminar os concorrentes, deixando o consumidor sem opção de ir atrás do preço mais baixo.
Há outro aspecto especialmente irritante — e que tem a ver com essa situação de domínio.
Embora movimente um negócio bilionário, e seu crescimento seja um indicador de prosperidade, eu acho que o Pão de Açucar poderia pelo menos demonstrar um pouco de gratidão pela boa vontade de seus clientes.
Com uma frequencia surpreendente já assisti a protestos de clientes inconformados com a demora das filas do caixa. Recentemente, numa tarde de domingo, levei 15 minutos para fazer as compras e mais de 45 para ir embora. Outros fregueses viveram a mesma situação.
Por que?
Porque os caixas do Pão de Açucar não oferecem ao consumidor uma facilidade banal que se encontra nos Estados Unidos. Estou falando de empacotadoras automáticas, que permitem uma formidável economia de tempo.
Ao mesmo tempo em que a funcionária registra suas compras, uma máquina atrás dela faz o empacotamento. Assim, quando você acaba de pagar, todas as mercadorias já se encontram empacotadas e só é preciso empurrar o carrinho até o carro. Aqui não. Você precisa ficar fazendo o embrulho, muitas vezes sòzinho. Isso leva tempo.
Antes, a baixa tecnologia parecia ter uma função social. Estimulava o emprego de meninos de famílias humildes e adultos com pouca formação profissional. Agora, nem isso. Nós fazemos o serviço que em outros países é realizado por máquinas empacotadoras. Eu acho muito primitivo para quem se tornou uma das gigantes multinacionais em sua especialidade.
Confesso que semanas atrás fiquei surpreso quando o governo Dilma Rousseff resolveu incluir o empresário Abílio Diniz naquele comitê de empresários chamados a auxiliar o governo a melhorar a gestão do Estado. Fiquei imaginando que tipo de aperfeiçoamento ele poderia sugerir para a melhoria dos serviços públicos, e de que forma essas mudanças poderiam beneficiar 200 milhões de brasileiros.
Tenho uma questão parecida diante da proposta de fusão. Em vez de usar recursos públicos para auxiliar a criação de um grupo privado, que irá ganhar dinheiro em cima da fome do povo (desculpe a frase popularesca, foi mesmo involuntária mas é irresistível rsrsrsrs), seria mais legitimo fortalecer centros subsidiados para a venda de alimentos a um preço mais acessivel. É disso que a população pobre, prioridade deste governo, está precisando. Concorda?

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