sábado, 9 de fevereiro de 2013

CARNE DE CAVALO, VOCÊ JÁ COMEU???


Carne eqüina, suculenta e adocicada, começa a chegar aos cardápios de SP

JANAINA FIDALGO
da Folha de S.PauloEla tem coloração intensa e é bem suculenta. Aos olhos de um leigo, seria facilmente confundida com uma carne bovina. Na boca, diferencia-se pelo sabor mais forte e levemente adocicado. É carne do quê?! Carne de cavalo... Basta juntar as três palavras para ouvir reações adversas, provocadas geralmente pela imagem dócil do animal.
Caio Guatelli/Folha Imagem
Almondegas de carne de cavalo com risoto do restaurante Fricco
Almondegas de carne de cavalo com risoto do restaurante Fricco
Se em países como a França há açougues especializados na comercialização da carne do eqüino e compêndios gastronômicos com verbetes dedicados ao assunto, por aqui seu consumo ainda é novidade. O Brasil é um dos maiores exportadores, mas toda a produção tem destino certo: os países europeus. Ou tinha.
De maneira ainda tímida, a carne começa a ser servida no país. O Friccò, restaurante do chef italiano Sauro Scarabotta, está testando a aceitação dela.
"O brasileiro é muito carnívoro, mas quando sai da picanha e do filé mignon bovino, fica meio reticente", diz Scarabotta, que criou alguns pratos com carne de cavalo. "Um ou outro cliente sabia que na Europa se consome essa carne, mas muitos perguntaram: "É cavalo mesmo?". É porque aqui servimos bife a cavalo, aquele com o ovo em cima. Eu dizia: "É carne de cavalo, não a cavalo"."
De sabor agradável, o melhor jeito de degustá-la pela primeira vez --se a intenção for notar bem a diferença de gosto em relação à bovina-- é em preparos crus, como um steak tartar, um carpaccio ou um sashimi. Rica em ferro, é recomendada aos anêmicos. Porém, custa mais que a bovina: de R$ 22 a R$ 28, o quilo, dependendo do corte.
Mas se a carne é saborosa, por que muitos brasileiros torcem o nariz ao ouvir falar nela?
"A repulsa não vem da carne, porque quase ninguém a experimentou, e sim porque o cavalo é um animal querido, com o qual as pessoas têm contato e afinidade. É como se falássemos em carne de cachorro", diz Guilherme Rinzler, diretor do Pomar, frigorífico de Araguari, em Minas Gerais, que há 47 anos exporta carne eqüina.(*)
Os cavalos não são criados para o abate. Provêm de fazendas e sítios onde são usados no pastoreio. Ao chegarem a uma idade mais avançada, são comprados pelos frigoríficos. O abate de animais de hípica, por sua vez, foi proibido para evitar problemas com resíduos de remédios e anabolizantes.
"Quando vai ficando velho, o cavalo de lida é uma dor de cabeça para o sitiante, que mal consegue sustentar a família. Isso acaba, não intencionalmente, gerando maus tratos. O frigorífico torna-se uma solução", diz o professor do departamento de economia da Esalq-USP Roberto Arruda de Souza Lima, que já publicou artigos sobre carne de cavalo.
"Na Europa, a idéia de perder uma carne nobre como a do cavalo, de deixar o animal morrer no pasto, não existe", diz Michel Rinzler, dono do Pomar.
Para o italiano Sergio Gatti, consultor de carnes exóticas responsável pela divulgação da carne eqüina, o consumo é uma questão de hábito. "Na Itália, somos acostumados a comê-la, mas aqui há uma grande barreira. Por isso, comecei pelos chefs estrangeiros, que já têm essa proximidade", diz Gatti.
O chef Marcelo Pinheiro conta que no restaurante Tarsila, em São Paulo, onde pratos com carne de cavalo já foram servidos, a aceitação foi boa.
"É uma carne diferenciada da que estamos habituados. Mas dependendo do corte, não difere tanto da bovina", diz. "Estou fazendo um novo cardápio e quero voltar a usá-la."
Para ser comercializada, a carne precisa ter o SIF (Serviço de Inspeção Federal), selo do Ministério da Agricultura que garante sua qualidade. Antes de ser abatido, o animal passa por uma análise clínica feita por um funcionário do próprio órgão governamental. Depois, a carne é inspecionada e testada.
"Não se come mais só para suprir o consumo energético, mas pelo prazer de conhecer. Caso contrário, a gente se restringiria a comer só um tipo de carne, de peixe. Comer faz parte da cultura que vamos agregando", diz Scarabotta.

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