Patrono dos homens públicos improbos
O suspeito veio na comitiva
de Tomé de Sousa
A História colonial do Brasil pode ser vista como um manancial permanente de exemplos, metáforas e lições para qualquer interessado em entender melhor o país que hoje é. Vejamos o caso de nosso primeiro "ministro da Justiça", Pero Borges. Ele desembarcou na Bahia em 29 de março de 1549, na comitiva do primeiro governador-geral da colônia, Tomé de Sousa. Ocupava cargo de relevo: meses antes, fora nomeado ouvidor-geral do Brasil. O posto - que equivaleria hoje ao de ministro da Justiça - proporcionava-lhe alto salário: Pero Borges ganhava 200 mil réis por ano (quantia que ele, valendo-se de uma "largueza do rei", conseguiu receber antes de embarcar).
O adiantamento de salário esteve longe de ser o único favor que dom João III prestou ao dileto súdito. Corregedor em Elvas, Portugal, o doutor Borges foi por ele incumbido, em 1543, de supervisionar a construção de um aqueduto. Adquiriu o estranho hábito de receber dinheiro em casa, "sem a presença do escrivão nem do depositário". Quando as obras foram paralisadas antes de concluído o aqueduto, "algum clamor de desconfiança se levantou no povo".
Viagem Tomé de Sousa levou para a Bahia, na comitiva, o interditado doutor Pero Borges |
No dia 17 de maio de 1547, condenado "a pagar à custa de sua fazenda o dinheiro extraviado", ele também foi suspenso por três anos do exercício de cargos públicos. A 17 de dezembro de 1548, no entanto, passados somente um ano e sete meses da sentença, o mesmo Pero Borges foi nomeado, pelo mesmo rei, para o cargo de ouvidor-geral do Brasil. No dia 1º de fevereiro de 1549, zarpou com Tomé de Sousa rumo à colônia.
No Brasil, Pero Borges se deu bem. Não apenas ficou no posto pelos três anos de duração do primeiro governo-geral como também acumulou o cargo de provedor-mor da Fazenda (o equivalente a ministro da Economia) no governo seguinte, de Duarte da Costa, a partir de 1553. Era a raposa cuidando do galinheiro.
Fotos: Alexandre Sant'Anna/ÉPOCA, Reprodução
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