domingo, 4 de agosto de 2013

DAHAS ZARUR, A MENTE QUE FALHA!

VERA ARAÚJO (EMAIL·FACEBOOK·TWITTER)
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Dahas Zarur afirma que houve algum equívoco no registro dos imóveis: “Alguém tem que assinar”
Foto: Agência O Globo


Dahas Zarur afirma que houve algum equívoco no registro dos imóveis: “Alguém tem que assinar” Agência O Globo
RIO - A voz é pausada e rouca, o corpo já demonstra cansaço, mas a mente do advogado e jornalista Dahas Chade Zarur, de 87 anos, é bem aguçada. E sabe de cor a história da Santa Casa de Misericórdia do Rio, irmandade filantrópica criada em 1582 pelo padre jesuíta José de Anchieta, da qual desde 2004 Zarur é provedor, o que equivale a presidente. Desde 1953 na entidade, onde começou como escrevente, Zarur acumulou um patrimônio expressivo que repassou para o filho, a nora e as duas netas. Em 20 anos foram 35 imóveis, num total de 42 transações imobiliárias. Dez deles na área mais nobre do Leblon, como na Avenida Delfim Moreira e na Rua General Artigas, na quadra da praia, onde o metro quadrado custa R$ 36.667. A memória de Zarur só falha quando ele precisa se lembrar como três imóveis da lista de bens da Santa Casa, cujas certidões foram obtidas pelo GLOBO, passaram, misteriosamente, para seu nome e depois foram vendidos.
Na sede da Santa Casa, na Rua Santa Luzia, onde trabalha todos os dias das 11h às 17h, Zarur é um homem de hábitos simples. Mas sua vida no trabalho contrasta com o império que deixou para a família. No Leblon, há ainda apartamentos nas avenidas Ataulfo de Paiva e Visconde de Albuquerque, e na Rua General Venâncio Flores. Só na General Artigas, a família Zarur possui dois imóveis com quatro vagas na garagem. Zarur, que atualmente não tem sequer um bem em seu nome, mora em um deles. Segundo o mercado imobiliário, um apartamento na área não sai por menos de R$ 10 milhões.
Há ainda salas comerciais no bairro em nome de parentes de Zarur. E casas e apartamentos na Barra, a maior parte no Condomínio Novo Leblon, um dos mais caros do bairro, onde uma de suas netas mora, além de casas em Petrópolis. O provedor da Santa Casa e a mulher, Maria de Lourdes Mallet Zarur, de 73 anos, passaram a maior parte dos bens em doação com direito a usufruto ao único filho, Claudio Mallet Zarur, que morreu no ano passado.
Polícia investiga transações em cemitérios
No dia 7 de julho, o “Fantástico”, da TV Globo, revelou um esquema criminoso que envolve a venda ilegal de sepulturas em três dos 13 cemitérios públicos administrados pela Santa Casa. A Delegacia Fazendária da Polícia Civil instaurou inquérito para investigar se houve crime contra a administração pública nos cemitérios São João Batista (Botafogo), Caju e Cacuia (Ilha do Governador). O programa mostrou que os túmulos são vendidos e construídos ilegalmente por R$ 150 mil o metro quadrado em áreas mais nobres do cemitério ou em locais que já têm dono. Um funcionário chegou a acusar Zarur de participar do esquema. A delegada Izabela Santoni, que investiga o caso, já pediu informações sobre os imóveis de Zarur e de parentes dele no 5º e no 6º Ofícios de Registro de Distribuição:
— Estamos analisando a evolução patrimonial de Dahas Zarur e da família para tentar identificar se há alguma irregularidade na aquisição dos bens ou vínculo com o patrimônio da Santa Casa. Vamos investigar se há indícios de lavagem de dinheiro — explicou a delegada.
Ao analisar as certidões do registro de imóveis de Zarur, de 22 de junho de 1993 a 22 de junho deste ano, salta aos olhos a quantidade de imóveis por ele vendidos no Centro. Sete foram adquiridos pela mesma pessoa, Antônio Anizio Ribeiro, no mesmo dia: 30 de dezembro de 2008. É o caso do prédio no número 340 da Rua Buenos Aires, que, segundo o 6º Distribuidor, foi vendido por Zarur como se dele fosse. Mas ele próprio diz desconhecer a negociação e assegura que o bem pertence à Santa Casa. Inclusive, no lugar, funcionaria hoje um restaurante que gera um aluguel de R$ 7 mil para a entidade. Zarur afirma que também são da Santa Casa outros dois imóveis desses sete do Centro. São eles os de números 271 e 277 da Rua Senhor dos Passos. Zarur sugere ter havido erro do cartório:
— Deve ter ocorrido uma confusão. Só pode ter sido na fase de transição de quem eu substituí (como provedor). Se eu assinei é porque tinha que assinar, mas não me lembro. Alguém tem que assinar (a venda dos imóveis).
O diretor de imóveis da Santa Casa, Raimundo Marcelo de Oliveira, também argumenta que houve equívoco do Registro Geral de Imóveis (RGI):
— Já tivemos o caso de um imóvel baixado para usufruto no qual constaram meu nome e o do Dr. Zarur, quando tinha de ser o da Santa Casa. Pode ser que tenha constado na certidão que era dele, mas é da Santa Casa. Tem alguns que saíram no RGI com o nome do representante no lugar da entidade. Temos que regularizar isso.
Dos imóveis do Centro, Zarur só reconheceu como tendo sido seu um na Rua Santa Luzia 583. Mas, segundo ele, foi vendido:
— Sou eu que assino as escrituras. Vendi esse imóvel por R$ 40 mil. O Cesar Maia usou como escritório dele na campanha.
Apesar de O GLOBO constatar a ligação entre os bens de Zarur e os da Santa Casa em pelo menos três imóveis negociados no Centro, o provedor nega que tenha se beneficiado. De acordo com ele, seu patrimônio é fruto de uma lavanderia fundada na década de 50, que batizou de Aladim, logo após se formar em direito, aos 22 anos. Ele justifica a mágica da multiplicação dos imóveis da família com a venda dos terrenos de dois loteamentos em Campo Grande, na mesma época. Os antigos proprietários dos outros imóveis transferidos por Zarur para parentes só poderão ser conhecidos após um levantamento do histórico das transações imobiliárias de cada um deles.
Ex-diretor responsável pela administração dos imóveis da Santa Casa, o registrador público Antônio Carlos Leite Penteado, que já depôs na Fazendária, deixou o cargo em 26 de dezembro do ano passado, com mais cinco integrantes, por divergências administrativas com Zarur:
— Quando eu entrei, em 2004, a Santa Casa tinha mais de 700 imóveis. Em nove anos, acredito que foram vendidos cerca de 20. Eu tentava alugar um imóvel na Rua São Clemente, em Botafogo, quando soube que ele já estava vendido. Foi a gota d’água. Discordávamos da venda de imóveis quando consultados, mas eles eram vendidos assim mesmo.
Segundo Zarur, a entidade tem 766 imóveis alugados, 12 ocupados por ela mesma e 11 interditados ou invadidos. Ele nega que a Santa Casa — que administra 17 instituições — esteja em crise financeira, apesar de os funcionários se queixarem de atrasos no pagamento. Os hospitais perderam o credenciamento pelo SUS, e a entidade não tem mais o certificado de filantropia, além de os bens terem sido bloqueados.
Quando o assunto é o número de imóveis que lhe pertencem, a resposta de Zarur é sempre a mesma:
— Não posso dizer quantos imóveis tenho hoje, porque o meu filho morreu. Eu não me lembro. Quero passar tudo para minhas netas, porque eu estou no fim. Até morrer, fico com a receita.

 http://oglobo.globo.com/rio/dahas-zarur-provedor-da-santa-casa-negociou-35-imoveis-em-20-anos-9344861#ixzz2akdmCa3q 



 

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