O fim da doação de órgaõs
CLÁUDIA TREVISAN, CORRESPONDENTE / PEQUIM - O Estado de S.Paulo
PEQUIM - O governo chinês anunciou ontem que pretende abolir em cinco anos a prática de utilizar órgãos de prisioneiros condenados à morte em transplantes, uma fonte de constantes críticas ao país. Segundo a Anistia Internacional, 65% dos órgãos transplantados na China vêm de presos executados.
O vice-ministro da Saúde, Huang Jiefu, afirmou que o governo planeja substituir esse modelo por um sistema nacional de doação voluntária, algo praticamente inexistente no país, o que leva a uma carência crônica de órgãos.
Segundo o governo, a cada ano 1,5 milhão de chineses precisam de transplantes, mas apenas 10 mil recebem os órgãos de que necessitam. Os condenados à morte são a principal fonte. A China executa mais pessoas do que a soma de todos os outros países que adotam a pena de morte. Mas o governo reduziu nos últimos anos o número de crimes punidos com pena capital, o que reduziu a oferta de órgãos, segundo a agência oficial de notícias Xinhua.
A China não revela estatísticas de execuções, mas a entidade americana Dui Hua estima que foram 4 mil no ano passado, menos de um terço das 15 mil mortes estimadas em 2000.
"Essas mudanças representam um desafio para a maneira chinesa tradicional de fazer transplantes de órgãos", afirmou o vice-ministro da Saúde. Além da redução no número de execuções, Huang citou razões médicas para a criação de um sistema nacional de doações. De acordo com ele, os órgãos de prisioneiros apresentam maior incidência de infecções por fungos e bactérias, o que reduz a expectativa de vida dos pacientes que os recebem.
O assunto foi discutido durante Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, este mês. Um dos principais especialistas em doenças do fígado no país, Liu Zhihong, disse no encontro que "apenas 5 mil" transplantes desse órgão são realizados ao ano. Isso significa que apenas 1 em cada 150 pacientes é submetido a cirurgia.
O baixo índice de doações na China é explicado pela crença tradicional de que as pessoas devem ser cremadas ou enterradas com todos os órgãos. Essa carência alimenta um inflacionado mercado negro de tráfico de órgãos. No ano passado, dois homens foram julgados por vender fígados por US$ 23 mil.
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