Mercado
Ritmo de atualizações irrita os consumidores de tecnologia
Reportagem de VEJA mostra que os constantes lançamentos de novas - e desnecessárias - versões de eletrônicos acabam com a paciência dos usuários
Filipe Vilicic
Pouca coisa irrita tanto como os avisos constantes de que "há atualizações disponíveis"
O americano Gordon Moore, fundador da Intel, fez uma previsão em 1965 que se tornou o mais conhecido parâmetro da computação. Moore estimou que a capacidade de processamento dobraria, sem aumento de custo, a cada dois anos. É a Lei de Moore. Aplicado esse princípio no universo do consumo, significa que computadores e tablets melhoram expressivamente seu desempenho nesse intervalo de tempo. Ou seja, dois anos é um bom prazo para usufruir de um aparelho antes de pensar em trocá-lo por um novo. Ocorre que, nos últimos tempos, os fabricantes de softwares e hardwares passaram a desprezar a Lei de Moore. Atualizações de programas e novas versões de produtos chovem em ritmo frenético em lojas e na tela de computadores. Raras vezes as diferenças de uma versão para outra justificam tanta pressa. A quarta geração do iPad foi lançada há duas semanas, apenas sete meses depois da terceira. O espaço de tempo decorrido entre o surgimento do novo sistema operacional de Macs, o Mountain Lion, e o de seu antecessor, o Lion, foi de apenas um ano. Entre o smartphone Lumia 900, da Nokia, e o Lumia 920, cujas vendas começam nesta semana na Europa, passaram-se sete meses. Quem comprou um Lumia 900 tem nas mãos um celular praticamente novo. A versão 920 não traz nenhum avanço tecnológico que torne aceitável gastar centenas de dólares na troca. Apresentado na semana passada pelo Google, o celular Nexus 4 também pouco evoluiu em relação ao Galaxy Nexus, lançado há um ano. Quem troca uma geração de um produto por outra muitas vezes se sente incomodado com a falta de novidades - e com boas razões. As mudanças são ligeiras na maioria das vezes e não justificam o custo de cada novo hardware ou software.
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Fadiga digital - Um levantamento da Underwriters Laboratories, organização americana que testa e certifica produtos, concluiu que consumidores estão fartos das constantes atualizações. A pesquisa ouviu 1 200 americanos, chineses, alemães e indianos. Metade dos entrevistados acredita que os fabricantes apresentam novos produtos mais rapidamente do que as pessoas possam precisar deles. Ou seja, há sinais de fadiga no consumo de tecnologia. Isso não quer dizer que os outros 50% se empolguem a cada lançamento - a maior parte deles é provavelmente indiferente. Apesar das evidências do aumento da resistência dos consumidores ao ritmo de novidades, empresas insistem na tática comercial de oferecer novos smartphones, tablets e programas de computador. O mesmo levantamento ouviu 1 200 executivos em empresas de tecnologia e descobriu que oito em cada dez acreditam que, para se manter no negócio, é necessário inovar constantemente. Também se notou que as companhias de tecnologia consideram o tópico inovação o mais relevante para se destacar diante da concorrência. Em terceiro lugar ficou "chegar rápido ao mercado". Em conjunto, os dados são claros: desenvolvedores acham que precisam atualizar softwares e hardwares cada vez mais depressa para chamar atenção. Na prática, arriscam causar aversão.
Há duas explicações para a má vontade detectada pelo estudo. Uma é bem conhecida: as atualizações são insuportáveis. Pouca coisa irrita tanto como os avisos constantes de que "há atualizações disponíveis". Dois campeões nessa modalidade, o Adobe Flash Player e o Java, fazem isso com o objetivo de se precaver contra vírus. Para piorar, baixar as novas versões desses softwares costuma impedir que o computador execute outras tarefas enquanto dura o download. Aí vem outra dor de cabeça: a necessidade de reiniciar o computador e esperar que o sistema operacional se adapte às alterações. O ritmo varia, mas o Java e o Adobe chegam a pedir três atualizações numa única semana. Outra razão para a irritação dos consumidores é a falta de novidades de peso entre uma versão e outra. Ninguém gosta de pagar por mudanças tão ralas.
O iPhone 5, apresentado em setembro, é um caso exemplar. A ausência de novidades no smartphone foi motivo de chacota na internet. Em uma delas, um chefão da Microsoft pergunta a seu par da Apple: "Qual é sua estratégia para vender mais?". A resposta: "Vou aumentar um pouquinho o tamanho do meu smartphone antigo". No último quadro da charge virtual, ambos dão risada. A única mudança significativa do iPhone 5 em relação ao antecessor, o 4S, foi a tela, que passou de 3,5 para 4 polegadas. Similar falta de inovações marca o iPad Mini, cujas vendas começaram na semana passada. Ele seguiu o caminho contrário ao do iPhone 5. Em vez de ser maior que o antecessor, é um pouco menor. A estratégia de pouco evoluir se repete em seu irmão mais velho, o iPad maior. A terceira versão do tablet tinha pouca novidade em comparação à segunda. A diferença da quarta para a terceira foi ainda menor. O resultado é que nos últimos três meses a Apple vendeu quase 4 milhões de iPads menos do que o previsto.
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