quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

BRASILEIROS, ALERTA!!!

colunistas

21/12/2010 - 17:06 - Atualizado em 22/12/2010 - 15:56
10 razões para se indignar
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Uma pessoa indignada não é necessariamente raivosa. Indignar-se com a injustiça é estar alerta

Ruth de Aquino
Época

RUTH DE AQUINO
é diretora da sucursal de ÉPOCA no Rio de Janeiro
raquino@edglobo.com.br

Um pequeno livro, quase um panfleto, de 30 páginas, tornou-se a sensação literária na França neste Natal. O nome do autor, Stéphane Hessel, não explica o sucesso. Sua idade, 93 anos, muito menos. São dois os motivos para o livro sumir das prateleiras. O preço baixo, de € 3 (R$ 7). E o título provocativo, Indignez-vous (Fique indignado) . Por incitar os jovens ao não conformismo pacífico, Hessel virou uma celebridade pop. Lembra o candidato do PSOL à Presidência, Plínio de Arruda Sampaio, de 80 anos.

Hessel nasceu em Berlim, de pai judeu escritor e mãe pintora. Foi para Paris aos 7 anos de idade. Na Segunda Guerra Mundial, lutou na Resistência contra o nazismo. Ajudou a redigir a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948. Suas causas hoje são o Estado palestino, o meio ambiente, os direitos dos imigrantes, a liberdade de imprensa e a batalha contra o mercado financeiro. “Meu fim não está muito longe”, escreve. “Desejo, a cada um de vocês, que tenham um motivo para se indignar. Isso é precioso.”

Uma pessoa indignada não é necessariamente raivosa. Indignar-se com a injustiça é estar alerta. “Os governos, por definição, não têm consciência”, escreveu o romancista Albert Camus, em 1954. Felizes são os homens e as mulheres que não aceitam passivamente os malfeitos dos governos e dos indivíduos. A indiferença nos faz menos humanos. A resignação pode nos tornar cúmplices.
Uma pessoa indignada não é necessariamente raivosa. Indignar-se com a injustiça é estar alerta

Reduzir a lista abaixo depende da vontade política da presidente eleita e da atitude pessoal de cada um de nós. Eis 10 razões para se indignar no Brasil:

* o número de analfabetos funcionais na oitava economia do mundo. Uma contradição provocada pela contínua falta de prioridade na educação fundamental e na qualidade da instrução;
* os absurdos privilégios dos deputados e senadores, que aprovam aumentos para si mesmos e, além do salário, dispõem de uma verba extra irreal. Com R$ 26 mil mensais, deveriam abrir mão das mordomias;
* a influência excessiva da Igreja sobre o Estado laico brasileiro. Em assuntos como células-tronco, controle da natalidade ou descriminalização do aborto, por que a religião se sobrepõe a razões de saúde e ciência? Que se respeitem a fé e os ditames do Vaticano como opções individuais, mas não como condutores de políticas públicas;
* a impunidade de assassinos confessos, como o jornalista Pimenta Neves. Com recursos em cascata permitidos por lei, quem tem dinheiro, prestígio e diploma se safa da prisão, mesmo depois de confessar crime hediondo e ser condenado por júri popular;
* a agressividade no trânsito, que torna o Brasil recordista em mortes em acidentes. O antropólogo Roberto Da Matta acaba de escrever um livro sobre isso: “Dirigir com cautela no Brasil significa ser barbeiro, bobo e idiota”. Acelerar para assustar pedestres, fechar o outro veículo, entrar na vaga alheia, bloquear os cruzamentos, xingar. Não é assim no exterior;
* a falta de educação da elite brasileira. Boa parcela de ricos desenvolve falta de educação associada à arrogância e à crença na impunidade. Joga lixo nas praias e da janela de carros importados, dá festanças ignorando a lei do silêncio, viola a legislação ambiental e sempre quer levar vantagem;
* os impostos escorchantes, que não resultam em benefício para a população carente. Cartéis punem o consumidor e tornam produtos e passagens aéreas no Brasil muito mais caros;
* a falta de sistema de saúde pública que dê dignidade a quem precisa e aos mais velhos. Gente morrendo em fila de hospital ou por falta de leitos e médicos é inaceitável. Quantas CPMFs o governo exigirá?;
* a falta de política de habitação decente para os mais pobres, mesmo com tantos prédios públicos vazios;
* a inexistência de transporte de massas, num país que fez opção equivocada pelo carro. Metrôs e trens, ligados a uma rede de ônibus sem ranço de máfias, deveriam transportar todas as classes sociais.

Indigne-se, mas não seja chato. Contribua para a mudança. Melhor ser um indignado otimista que um resignado deprimido. Boas festas.



Comentários

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Pio Barbosa Neto | CE / Fortaleza | 22/12/2010 21:29
Sob o signo da indignação
O ser humano só é capaz de ter a inteligência do mundo e comunicá-la quando se torna sujeito. Deve tornar-se cada vez mais crítico, mais atento à rigorosidade metódica de sua curiosidade, na sua aproximação aos objetos. Afinal, o que hoje nos leva a indignação? O que hoje nos move em direção à luta? O que restou de nossa veia revolucionária de outros tempos? Parece que bem pouco. A indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las. A nossa indignação é sempre localizada e, nessa medida, distorcida. Enumerar as razões que temos para indignar-se contra o que ora se estabelece no país envolve uma reflexão profunda acerca dos descaminhos pelos quais, percebemos a realidade do mundo que nos entedia e nos aflige. É preocupante saber que somos uma nação, onde casos de corrupção, pedofilia, violência doméstica, racismo, impunidade, estupros, colidem num espaço onde se vê o desmonte da ética, e o crescimento alarmante da marginalidade, além de crianças no tráfico, meninas prostituídas, jovens viciados, numa teia de morte que macula e enlameia o tecido social envolto em vestes de podridão e vergonha. O educador Paulo Freire afirmou que “uma educação crítica radical não pode jamais prescindir da percepção lúcida da mudança que revela a presença interveniente do ser humano no mundo”. São os sonhos, as utopias por que os homens e mulheres lutam que mudam o mundo e eles e elas se assumem como seres transformadores quando se tornam capazes de reconhecer a capacidade de adaptar-se à concretude para melhor operar. Ele frisa: ”adaptar-se sim, acomodar-se jamais”. Ele diz que há uma tensão dialética nas relações entre autoridade e liberdade. Autoridade não é autoritarismo, assim como liberdade não se confunde com “licenciosidade.” Mudar o mundo é tão difícil, mas é possível. Há fatores condicionantes para a imobilização, mas estes não são determinantes.

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