BUENOS AIRES - O clima de mal-estar em muitos países, até mesmo de sócios da Argentina no Mercosul, em relação a políticas e atitudes do governo de Cristina Kirchner não começou com a expropriação de 51% da Repsol-YPF. Em março passado, por exemplo, um grupo de 40 países apresentou uma queixa por escrito à Organização Mundial de Comércio (OMC) pelas barreiras impostas pela Casa Rosada ao comércio.
O crescente protecionismo argentino também gerou críticas formais e enfáticas por parte dos governos do Uruguai e Paraguai e, menos ruidosas, do Brasil. A estratégia econômica e comercial da administração K provoca temor entre empresários locais e estrangeiros e, segundo analistas argentinos, poderia aprofundar o isolamento de um país que hoje está em quinto lugar no ranking de investimentos estrangeiros diretos na América Latina, abaixo dos vizinhos Brasil, Chile, Peru e Colômbia.
O jornalista argentino Fernando Laborda publicou semana passada um artigo no “La Nación” intitulado “Brigados com o mundo”. No texto, Laborda comparou a expropriação da Repsol à invasão das Malvinas, comandada pelos militares argentinos em abril de 1982. “As comparações costumam ser odiosas. Mas vale lembrar que, durante os preparativos para a Guerra das Malvinas, muitos militares imaginaram que só enfrentariam o Reino Unido. Rapidamente descobriram que por trás dos britânicos estavam Estados Unidos e Otan”..
De fato, depois de uma morna crítica da secretária americana de Estado, Hillary Clinton, no dia em que a Casa Rosada anunciou a intervenção da companhia petrolífera e o envio ao Congresso do projeto de expropriação, o governo de Barack Obama endureceu o discurso.
— Esse tipo de ação pode afetar de forma adversa o clima de investimentos para os negócios americanos, para outros negócios e para companhias de outros países — assegurou o porta-voz do Departamento de Estado, Mark Toner.
‘Precisamos ser invisíveis’, afirma empresário
A última ousadia de Cristina provocou comoção entre empresários com operações no país. Ninguém se atreveu a comentar a iniciativa. A União Industrial Argentina (UIA) optou pelo silêncio e os principais homens de negócios do país decidiram esperar a tempestade passar, antes de comentar algo que pudesse ser mal visto pelo governo. Procurados pelo GLOBO, representantes de grandes empresas pediram desculpas, mas só aceitaram falar sem revelar a identidade.
— Neste momento precisamos ser invisíveis, estamos abaixo do nível do mar — brincou um empresário, que tentou resumir o sentimento dos homens de negócios, argentinos e estrangeiros.
— Com este governo, tudo é possível. O conceito de propriedade privada está em risco. Diria até que nossa liberdade é condicional — disse a fonte, lembrando que alguns empresários sofrem perseguições judiciais e tributárias por parte do Executivo e organismos estatais como a Afip (Receita Federal local).
A ofensiva nos tribunais atingiu consultores privados que divulgavam projeções e resultados do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) com números muito acima dos calculados pelo polêmico Indec (o IBGE argentino), acusado de manipular as estatísticas do país. Os consultores foram denunciados pelo secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, interventor do Indec desde 2007. Os dados do organismo perderam total credibilidade e hoje os argentinos consultam outras fontes de informação não oficiais, como o site www.inflacionverdadera.com, que todos os meses informa a evolução do IPC.
Kicillof: empresas têm de ter sintonia com a política
O discurso do vice-ministro da Economia, o jovem Axel Kicillof, terça-feira passada, aumentou o nervosismo entre os empresários. Kicillof é autor do projeto de expropriação da Repsol e tornou-se uma espécie de guru econômico de Cristina. Na sua opinião, as empresas que tenham atividades na Argentina devem estar em sintonia com o projeto político do governo.
— Depois de ouvir Kicillof, a conclusão é de que qualquer um de nós poderia ser o próximo — afirmou outro empresário.
Na opinião de Juan Tokatlian, professor de Relações Internacionais da Universidade Di Tella, “mais do que isolar-se, governo e elite terminarão isolados por uma mistura de ações próprias e reações de outros”.— Quanto mais punida pelo Ocidente, a Argentina olhará mais para o Oriente — disse Tokatlian, antecipando possíveis alianças com países como a China.
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